Políticos sérios sempre são
antipáticos. O povo prefere a cortesia dos que lhe bate a carteira. Wagner
Winter 2011
Eu sou apenas
O tempo é um eterno fugitivo, por isso, a vida deve ser intensa e a intensidade de viver advém de valores benéficos a sua continuidade, pois o dia seguinte está por amadurecer e deverá ser vivido com a mesma intensidade de hoje. Tempus Fugit, Carpe Diem.
quinta-feira, 26 de novembro de 2015
AFORISMOS POLÍTICOS III
Os políticos
virtuosos sempre estão do lado certo da vida social, é onde batem os holofotes
e os espetáculos pirotécnicos são constantes. Wagner Winter 2011
AFORISMOS POLÍTICOS II
O Brasil sempre foi
uma nação anônima de virtudes em sua essência política! Wagner Winter 2011
AFORISMOS POLÍTICOS
É importante não
esquecer que a corrupção não é um problema de um partido político, mas uma
displasia dos valores da sociedade brasileira. Wagner Winter 2011
A DEMOCRACIA ESTÁ NA LEI MAIOR!
A nossa Constituição em seu artigo primeiro, parágrafo único
diz: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes
eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. No que interrogo,
apesar da beleza do princípio democrático, que poder é esse? Perdão; quase
esqueci que o poder do povo é o voto e o exercício da cidadania é votar.
Que belo poder! Se não fosse obrigatório poucos o
exerceriam. A política anulou a questão da vontade, intenção de fazer ou deixar
de fazer. A vontade é prevalente em quase todo o Direito Pátrio, para ser mais
claro, a vontade é decisiva no Direito Civil e Penal.
Não questiono a democracia,
mas os instrumentos que inibem a livre expressão da vontade popular. O teatro
eleitoral, a falta de reformas no viciado sistema político brasileiro, a compra
de votos e a substituição dos antigos “coronéis” pelas facções criminosas, em
especial, as operadoras do narcotráfico e as milícias.
quinta-feira, 14 de maio de 2015
A Desconstrução do Racionalismo Kantiano
Talvez seja
indagável ou, mesmo, inimaginável a motivação que leva o autor a abordar uma
tarefa, aparentemente abantesma no meio acadêmico atual e, em especial, na Área
do Direito. Contudo, não é objetivo chegar à tamanha apologia da filosofia
clássica que possa desestruturar qualquer kantiano convicto. Não resta, ainda,
a menor intenção de colocar no mesmo cesto os racionalistas positivistas das
classes produtivas com os representantes das classes ociosas, estes, de
duvidosa convicção ideológica. Basta devolver ao racionalismo a dúvida de sua
validade como ciência e filosofia para facilitar o enxergar das manipulações
positivistas que fazem do Direito uma propriedade privada, uma ciência
zabaneira que se presta a locupletação de pecúnia, de poder e de prestígio as
classes ociosas deste país.
Postos os
devidos esclarecimentos, inicia-se o diálogo com o filósofo Olavo de Carvalho
que para um curso de filosofia produziu uma apostila intitulado: Tratado de Metafísica
Dogmática, Rio, Seminário de Filosofia (1996).
Se o
primado da dúvida metódica é apenas o primado de um equívoco verbal, então fica
sob suspeita, igualmente, o primado kantiano do problema crítico. Pois, se o
conhecimento humano deve prestar reverência preliminar ante a consciência de
seus limites, por que não deveria também submeter-se à exigência de uma
justificação preliminar a pretensão de conhecer esses limites?
A
motivação imediata que levou Kant a investigar os limites do conhecimento
humano foi o estado de profunda irritação em que o deixaram os relatos de
Emmanuel Swedenborg sobre visões do céu e do inferno. Os únicos trechos da obra
kantiana onde sentimos que a habitual frieza analítica do autor cede lugar a um
tom de sarcasmo e de polêmica apaixonada, são aqueles em que Kant procura rebaixar
os depoimentos do místico sueco a alucinações de uma mentalidade doente. O
escrito Sonhos de um visionário marca
justamente a passagem da fase pré-crítica à maturidade do pensamento kantiano.
É manifesto que a filosofia crítica tem menos
o objetivo de dar um fundamento ao conhecimento científico do que
simplesmente de explicitar os fundamentos dados por pressupostos, ao mesmo
tempo que nega qualquer fundamento científico aos conhecimentos de ordem mística e metafísica, reduzindo portanto a religião a um conjunto de mandamentos morais sem qualquer respaldo cognitivo.
Mas o
curioso é que o filósofo crítico, tão cioso de não se deixar enganar por
pressupostos dogmáticos, dá por pressuposta não somente a validade da ciência
física, como também a aptidão da razão para conhecer seus próprios limites.
Para além do campo dos juízos a priori e da experiência sensível, estende-se
apenas, segundo ele, o domínio do incognoscível: pensável, admite Kant, mas
incognoscível. No entanto, como se
poderia determinar os limites do cognoscível sem algo conhecer do suposto
incognoscível cuja borda externa coincide precisamente com esses limites?
Se a razão conhece os limites do sensível e, ao mesmo tempo, estatui os seus
próprios limites, como poderia ela determinar, igualmente, os limites do
terceiro campo, especificamente diferente, que é o da experiência
racionalizada, ou ciência, se, conforme diz o próprio Kant, é só a imaginação que conecta o racional e o
sensível? Para ser coerente, Kant
deveria ter dito que não há limites para a ciência, exceto os da imaginação.
Pois, na medida em que opere balizada pela razão e pela experiência sensível, a
imaginação, na perspectiva kantiana, não nos dará somente pensamento, mas
conhecimento, de pleno direito. E, se é assim, por que rejeitar dogmaticamente
a possibilidade de, partindo do sensível, escalar imaginariamente os graus do
supra-sensível? Nada, no kantismo, prova
que isto seja impossível ou sequer difícil[1].
Destaca Olavo de Carvalho (1996): os limites de uma determinada capacidade
só podem ser de duas ordens, ou seja, ou são intrínsecos ou extrínsecos, sendo que
os limites intrínsecos podem ser conhecidos por dedução a partir do seu
conceito, ao que Kant denominou de conhecimento a priori e analítico. Contudo,
Kant não admitia que nenhuma dedução, a
priori, pudesse migrar imotivadamente para o domínio dos fatos, exigindo,
para tal, a validação do fundamento experimental. “Logo, os limites intrínsecos do conhecimento humano, caso conhecidos,
seriam puramente formais e não se aplicariam ao conhecimento de nenhum objeto
real e determinado. Seriam, por assim dizer, limites vazios, hipotéticos, que
na prática não limitariam nada”.[2] De outra sorte, os limites extrínsecos não poderiam ser, em nenhuma
hipótese, necessários e incondicionais, mas acidentais e contingentes, pelo fato só poderem ser determinados
indutivamente, a partir dos vários conhecimentos efetivos concernentes às
várias espécies de objetos; e pelo fato mesmo de serem extrínsecos.[3]
Procurando
determinar a priori os limites reais do conhecimento humano, o que é impossível
segundo o próprio kantismo, ou provar por indução de fatos contingentes que
esses limites são necessários e incondicionais, a proposta da filosofia crítica
é, para dizer o mínimo, uma falácia em toda a linha.
O
primeiro e o mais básico dos limites assinalados por Kant é que o campo da
experiência está circunscrito pelas duas formas a priori da sensibilidade, o
espaço e o tempo. Mas aquilo que está num lugar determinado está também, a fortiori, no infinito supra-espacial;
e aquilo que ocorre num instante determinado acontece também, a fortiori, dentro da eternidade — duas
necessidades a priori das mais óbvias que, por si, dariam por terra com os
famosos limites que a filosofia crítica procurava estabelecer.[4]
Olavo de Carvalho possui uma imensa capacidade crítica analítica e,
pacientemente, produziu inúmeros trabalhos de desconstrução dogmática em várias
áreas do conhecimento humano. Abordou-se no capítulo Prolegômenos da Metafísica o campo de investigação da Teologia e a
necessidade do respeito pela transcendência como um conhecimento existente, a priori, mas inexplorável
racionalmente, porém, não reputado como inválido em nenhum momento. Olavo de
Carvalho trabalha no texto abaixo a defesa do pensamento de Sto. Anselmo que,
de forma resumida, o próprio Olavo transcreve: a existência de Deus é auto-evidente por mera análise, de vez que o Ser
infinito e necessário não poderia ser privado da existência, sendo toda
privação uma limitação, contraditória portanto com a infinitude, e a
possibilidade mesma de uma limitação sendo uma contingência, contraditória com
a necessidade.[5]
Mais que
logicamente certo, o argumento ontológico é auto-evidente. Denomino
auto-evidente o juízo que não pode ter uma contraditória unívoca, ou seja, cuja
contraditória não é sequer formulável sem o vício redibitório da ambiguidade.
Que eu saiba, esta característica dos juízos auto-evidentes não tinha sido
ressaltada até agora. No caso, qual a contraditória do juízo "O ser
necessário existe necessariamente"? É "O ser necessário inexiste
necessariamente" ou "A existência do ser necessário não é
necessária"? Impossível decidir. A contraditória do argumento de Sto.
Anselmo é informulável. Rejeitar portanto esse argumento é abdicar do senso
mesmo da unidade do discurso, é cair na linguagem dupla que terminará por nos
levar aonde chegou Kant.
Porém a
raiz de todas essas absurdidades está precisamente na fé dogmática que Kant,
imitando Descartes, coloca no poder humano de duvidar. Pois como podemos, de
fato, duvidar de nossa possibilidade de conhecer o absoluto? Se nada,
radicalmente nada sabemos do absoluto, não podemos sequer formular nossa dúvida
quanto à possibilidade de conhecê-lo. Daí a necessidade de ter um ponto de
apoio no absoluto para formular a dúvida; mas como, ao mesmo tempo, Kant já
tomou essa dúvida como um ponto de partida infalível e não pode abdicar dela de
maneira alguma, só lhe resta procurar esse ponto de apoio nos limites mesmos do
conhecimento, elevados assim a absolutos e incondicionados, por um giro lógico
dos mais singulares. Assim, nada podemos saber do absoluto, exceto que ele está
"para lá" dos limites do nosso conhecimento, limites estes que, não
sendo determinados pelo absoluto (do qual nada sabemos) nem sendo realidades contingentes
e revogáveis (de vez que são provados por mera análise, sendo por isto válidos
a priori), passam eles mesmos a ser o próprio absoluto! Pois, se o pensamento
nada pode deduzir a respeito do que está fora dele, como pode então conhecer os
seus "limites", a não ser que estes sejam necessários a priori? Sendo
necessários a priori, são incondicionais; mas são também totais, abarcando o
conhecimento humano como um todo e não somente em algumas partes e aspectos: e
o todo incondicional é evidentemente absoluto. Logo, a prova de que não podemos
conhecer o absoluto sustenta-se no conhecimento que temos do absoluto, com o
nome mudado para "limites do conhecimento". Se isto não fosse atentar
iconoclasticamente contra um ídolo da modernidade, eu diria que o único
comentário que merece essa tese da filosofia kantiana é que se trata de coisa
pueril.
Do ponto
de vista teológico, a entronização dos limites do conhecimento como o novo
absoluto em lugar do velho Deus tem uma conseqüência das mais nítidas: o
absoluto passa a ser definido como o não-humano, o humano como não-absoluto.
Este abismo é, por sua vez, absoluto: Deus é tudo quanto está fora dos limites
do humano, humano é tudo o que está fora e aquém do reino divino. Ou seja: a
exclusão do humano do reino divino torna-se ela mesma um absoluto. Que Kant
pretenda em seguida resgatar à força de razão prática e fé pietista a ligação
entre homem e Deus, após ter demonstrado que ela é absolutamente impossível, só
mostra que ele não tinha muita consciência do que fazia. Pois, se a exclusão do
homem do reino divino é uma necessidade absoluta, nem mesmo a graça de um Deus
onipotente poderia revogá-la.
Na
verdade, não pode haver limites necessários ao conhecimento humano, sendo a
condição humana definida precisamente pela contingência e pela liberdade. Todos
os limites ao conhecimento humano têm de ser contingentes, e é precisamente
isto o que possibilita, de um lado, as diferenças de capacidade cognitiva entre
indivíduos e, de outro, o progresso do conhecimento. A tentativa de fundamentar
a priori os limites do conhecimento humano é autocontraditória e absurda na
base, reduzindo-se portanto a filosofia crítica a uma pretensão insensata, ao
"sonho de um visionário", que imagina poder puxar-se pelos cabelos
para fora da água como o Barão de Münchausen e contemplar de dentro os seus
próprios limites externos, como aquelas escadas de Escher cujo topo emenda com
o primeiro degrau.[6]
O Direito
brasileiro vive um período de confusão doutrinal e um esvaziamento
institucional nunca visto, mesmo nos tempos da ditadura militar. Por ocasião do
centenário da Teoria Pura do Direito de Hans Kelsen, muitas foram as homenagens ao grande teórico, verdadeiro pai
do método positivista do Direito no mundo. Negar a grandeza de Kelsen na
história do Direito é impossível, seria o mesmo que negar a grandeza de Adam
Smith ou de Karl Marx. Contudo, no dizer dos festivos Ministros do Supremo
Tribunal Federal, encontra-se o sarcasmo erístico de quem lidera um exército de
juristas bisonhos.
A autobiografia de Hans Kelsen, teórico que
formatou a estrutura do controle de constitucionalidade concentrado hoje
praticado não só no Brasil, mas em várias cortes constitucionais mundo afora,
foi lançada na segunda-feira (15/8). O evento reuniu grandes personalidades do
mundo jurídico brasileiro em uma suntuosa sala da Faculdade São Francisco. O
ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Tofolli foi o responsável pela
introdução da obra. Também estavam presentes o ministro Ricardo Lewandowski, do
STF, o desembargador Paulo Dimas, do Tribunal de Justiça de São Paulo, o
advogado Pierpaolo Bottini, colunista da ConJur, os juízes Ricardo
Nascimento e Ricardo Rezende, ex e atual presidentes da Ajufesp, o ministro
aposentado do Superior Tribunal Militar Flávio Bierrenbach, presidente de honra
da Associação de ex-alunos da São Francisco, e Antônio Magalhães Gomes Filho,
diretor da Faculdade de Direito da USP.
A autobiografia foi lançada este ano em que se
comemora o centenário da famosa teoria pura de Kelsen. Mais de 100 livros foram
vendidos durante o evento. Para o vice-presidente da Ajufe na 3ª Região,
Ricardo Nascimento, “o Direito brasileiro foi muito influenciado pela obra de
Kelsen, e pouco se sabia do homem. Portanto, o livro veio num momento
oportuno”.
Durante a sessão, um dos tradutores da
autobiografia, Gabriel Nogueira Dias, comentou a morte de Kelsen em 1973 e o
fato de seu patrimônio ter sido doado ao instituto que leva seu nome e já tem
40 anos de existência. Lembrou também da atuação do pensador na Carta das Nações
Unidas e comentou que a autobiografia estava perdida nos Estados Unidos.
O presidente da Ajufesp, Ricardo Rezende, agradeceu
a presença do professor e ex-ministro do Desenvolvimento Celso Lafer, e
enalteceu que não havia lugar melhor para abrigar o evento, referindo-se à
Faculdade São Francisco como “berço da cultura jurídica”.
Pergunta no ar
O ministro Ricardo Lewandowski contextualizou o
papel de Kelsen no cenário jurídico brasileiro. Lembrou que, nos tempos da
ditadura, houve um apego muito grande à obra do austríaco, interpretado como
positivista. Comentou, ainda, que o país não possuía uma Constituição, e sim
uma emenda. E que, durante esse tempo, o Código Civil tinha papel
fundamental.
O ministro contou que nesse período surgiram
juristas que entenderam que “era preciso abandonar o positivismo erroneamente
relacionado à Kelsen” e como reação a esse neo-positivismo, houve uma
liberalização da interpretação do Direito. Surgiu, então, o Direito
alternativo, extremo oposto ao positivismo. Esse movimento culminou na
Constituição da República, que segundo Lewandowski representou “a necessidade
de promover mudanças”.
O ministro citou a tendência do STF à
pró-atividade, haja visto que a corte brasileira começou a “desbordar das
balizas do Direito posto”, sobretudo na decisão em relação à união homoafetiva.
Lewandowski terminou seu discurso deixando uma pergunta no ar: "não seria
o momento de uma releitura de Kelsen?"
De Kelsen a Renato Russo
O ministro Dias Tofolli, entusiasta da obra da qual
foi responsável pelas páginas introdutórias, começou seu discurso lembrando,
com afeto, seus tempos de São Francisco e de quando ainda era estudante. Tal
lembrança acabou na leitura de um trecho “pitoresco” da autobiografia de
Kelsen, justamente onde o austríaco se mostra um aluno de Direito entediado com
as aulas e questionador da capacidade intelectual de seus professores. Para
Tofolli, isso revela que Kelsen não era uma “figura hermética”, ao contrário do
que a maioria pensa.
Tofolli comentou texto publicado pelo jornal Folha
de S.Paulo sobre o pensador, que afirma que ler Kelsen é aprender sobre o
Brasil. Para o ministro, o texto suscita a pergunta: qual o ditame que une o
país? A resposta é a Constituição. Ele citou também o interesse do teórico por
mitologia e a possibilidade da “Constituição ser a substituição do mito”.
O ministro fechou o discurso comentando que, em
seus tempos de estudante, ouvia-se muito Legião Urbana nas arcadas da São
Franscico, e uma das frases de Renato Russo, na visão do ministro, define bem o
essência do filósofo. “Disciplina é liberdade”. Para Tofolli, por meio do
método de Kelsen “podemos nos libertar das idiossincrasias, preconceitos e de
nós mesmos”. [7]
Disciplina é
liberdade (música Há Tempos – Legião
Urbana): Transcrevemos o texto postado por Maurício Gieseler no sítio Blog Exame
de Ordem.
|
Lembro-me que
li uma vez uma matéria falando do Renato Russo, e nela havia um comentário
dele sobre a impressão que aquela frase causou em algumas pessoas, que o
criticaram exatamente por afirmar que disciplina era liberdade. O Renato
Russo retrucou que era óbvio que ele se referia a autodisciplina, e não a uma
ideia de uma disciplina em um país recém saído do período da ditadura
militar.[8]
|
Pode-se agregar
que o mesmo letrista e intérprete expressava anseios e dúvidas de um país em
transição e que suas preocupações merecem ser citadas e analisadas pela
posteridade, no âmbito dos estudos de Memória, Sociologia, Ciência Política e
História Cultural. Ele escreveu Que País é esse? A música foi
uma resposta à frase dita por Francelino Pereira, Presidente da Aliança Renovadora Nacional - Arena, o
partido situacionista do regime militar brasileiro, proferida em critica à
descrença do povo quanto ao retorno do Regime Democrático, em 1976.[9]
Nas favelas, no Senado
Sujeira pra todo lado
Ninguém respeita a Constituição
Mas todos acreditam no futuro da
nação
Que país é esse?
No Amazonas, no Araguaia iá, iá,
Na Baixada Fluminense
Mato Grosso, Minas Gerais e no
Nordeste tudo em paz
Na morte o meu descanso, mas o
Sangue anda solto
Manchando os papéis e documentos
fiéis
Ao descanso do patrão
Que país é esse?
Terceiro mundo, se foi
Piada no exterior
Mas o Brasil vai ficar rico
Vamos faturar um milhão
Quando vendermos todas as almas
Dos nossos índios num leilão
Que país é esse?[10]
(foram suprimidas algumas frases
repetidas do refrão)
A linguagem
corrosiva do autor espelhava o ambiente do final dos anos 70, quando um regime
antigo estava a morrer, mas o novo ainda não tinha começado e precisava ser
preparado, cabendo grande responsabilidade aos juristas. Nada supera a tentativa
de mitificação da Constituição Federal. Não bastasse o ululante evento no
berçário da cultura jurídica, em uma semana novo evento é realizado, desta vez,
no próprio Supremo Tribunal Federal.
Organizada
pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli, juntamente
com seu assessor Otavio Luiz Rodrigues Junior, a obra “Autobiografia de
Hans Kelsen” foi lançada hoje na Biblioteca Ministro Victor Nunes
Leal, do STF, em Brasília. O livro, publicado pela Editora
Forense, celebra o centenário da "Teoria Pura do
Direito", de Kelsen, bastante conhecida no meio jurídico.
O
presidente da Corte, ministro Cezar Peluso, abriu o evento
ressaltando a importância de Hans Kelsen, que “influiu profundamente
na história e no pensamento jurídico ocidental” com a obra que criou a
Teoria Pura do Direito.[11]
Para ter-se um
dado estatístico, ainda que precário e muito reduzido, vale o registro de parte
do artigo: Constituição de 1988: longa, incompleta, boa e atual, por Robson Pereira (2011).
A
Constituição dos Estados Unidos recebeu 27 emendas em 224 anos de existência, a
última delas em 1992, quando ficou decidido que aumento de salários para
congressistas só valem para a legislatura seguinte. A do Brasil foi promulgada
em 1988 e já recebeu 67 emendas constitucionais – uma a cada quatro meses, em
média, sem contar as seis emendas constitucionais de revisão. A primeira
alteração na Constituição Brasileira foi feita em 1992 e seguiu o exemplo dos
EUA para os salários de deputados estaduais e vereadores. A mais recente, a de
67, foi publicada em dezembro do ano passado e prorrogou, por tempo
indeterminado, o prazo de vigência do Fundo de Combate e Erradicação da
Pobreza.
Mas a
comparação entre as constituições do Brasil e dos Estados Unidos param por aí.
Ou, pelo menos, não podem ser consideradas sob o ponto do tamanho ou das
alterações no texto, uma vez que o próprio conceito de mudança não é absoluto.
Não são raros os constitucionalistas brasileiros que defendem a tese de que a
grande maioria das emendas tem origem na não-regulamentação de inúmeros
dispositivos previstos no texto original e pouca correlação com a essência em
si.
Um
levantamento do próprio Congresso Nacional mostra que entre os 366 pontos
sujeitos a regulamentação exatos 127 permanecem tal como foram incluídos no
texto original em 1988. Por analogia, alegam alguns juristas, a Constituição
seria “melhor” se todos os seus dispositivos tivessem sido regulamentados, o
que praticamente triplicaria o número de emendas constitucionais, em um
raciocínio puramente aritmético.
O constitucionalista Alexandre de Medeiros alia-se com aqueles que
entendem que a Constituição do Brasil, ainda que não perfeita, é boa, atual “e
não deve nada para as de outros países”. É boa, segundo ele, por ter permitido
e contribuído para o fortalecimento de instituições como o Congresso, o
Judiciário e o Ministério Público, o que garante uma maior efetividade dos
direitos fundamentais. E atual, não porque tenha sido esse o objetivo dos constituintes
nos 20 meses de trabalho consumidos até se chegar ao texto final, mas pelo fato
de ser “genérica”, o que possibilita discussões sobre temas modernos, como
pesquisas com células-tronco embrionárias e aborto de feto anencéfalo, entre
outros.[12]
Olavo de
Carvalho escreveu um parágrafo que encerra este subtema com a exata ideia que se
desejava transmitir.
Mais ingênua, portanto, do que a
confiança dogmática do racionalismo clássico no poder cognoscitivo da razão,
mais visionária que a pretensão dos místicos a um conhecimento experimental de
Deus, é a confiança no poder humano de por em dúvida aqueles princípios que
fundam a possibilidade mesma da dúvida. Mais ingênuo que qualquer dogmatismo é
o princípio mesmo da filosofia crítica, que pretende estatuir dedutivamente
limites contingentes e indutivamente limites necessários. Mais ingênuos do que
nossos antepassados, que acreditavam na revelação e na razão, somos nós, que
acreditamos em Descartes e em Kant, supondo que a negatividade do seu ponto de
partida seja prova de modéstia metodológica, quando ela oculta, na verdade, a
mais sobre-humana das pretensões: a pretensão de estabelecer limites absolutos
ao conhecimento humano. Pretensão superior à do próprio Deus, que não cercou de
grades o fruto proibido, mas o deixou ao alcance da curiosidade de Eva.[13]
[1] Olavo de Carvalho. Kant
e o Primado do Problema Crítico - Tratado de Metafísica Dogmática, Rio,
Seminário de Filosofia, 1996 (apostila). http://www.olavodecarvalho.org/apostilas/kant.htm
acessado em 10/10/2011
[6] Olavo de Carvalho. Kant e
o Primado do Problema Crítico - Tratado de Metafísica Dogmática, Rio, Seminário
de Filosofia, 1996 (apostila). http://www.olavodecarvalho.org/apostilas/kant.htm
acessado em 10/10/2011
[7] Lançamento de obra sobre Kelsen reúne personalidades
- Por Camila Ribeiro de Mendonça. Revista Consultor
Jurídico, 16 de agosto de 2011. http://www.conjur.com.br/2011-ago-16/lancamento-autobiografia-kelsen-reune-personalidades-direito
acessado em 17/08/2011.
http://www.portalexamedeordem.com.br/blog/2011/04/disciplina-e-liberdade-2/ acessado
em 15/10/2011
[9] O Brasil em frases (publicadas
em VEJA e na imprensa em geral)
http://veja.abril.com.br/especiais/veja_40anos/p_092.html acessado em 15/10/2011.
[11]Autobiografia do jurista Hans Kelsen é lançada no
STF - Notícias STF - Quarta-feira, 24 de agosto de 2011. http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=187248&tip=UN acessado
em 25 de agosto de 2011
http://www.conjur.com.br/2011-abr-11/constituicao-federal-1988-longa-incompleta-porem-boa-atual acessado em 15/04/2011.
[13] Olavo de Carvalho. Kant
e o Primado do Problema Crítico - Tratado de Metafísica Dogmática, Rio,
Seminário de Filosofia, 1996 (apostila). http://www.olavodecarvalho.org/apostilas/kant.htm acessado em 10/10/2011
PROLEGÔMENOS DA METAFÍSICA
Na lavra de Habermas, encontram-se interessantes reações
sobre o retorno a formas metafísicas de pensamento no ano de 1988.[1]
É notório que o
ceticismo em relação a esse primado do ser sobre o pensamento e o peso próprio
da reflexão sobre questões de método, engendram motivos importantes que pesaram
na passagem do pensamento ontológico ao mentalismo. A auto-referência do
sujeito cognoscente abre o acesso para uma esfera interior de representações,
curiosamente certa, que nos pertence inteiramente, a qual precede o mundo dos
objetivos representados. A metafísica surgira como a ciência do geral imutável
e necessário; a partir de agora ele só pode encontrar um equivalente numa
teoria da consciência, a qual fornece as condições subjetivas necessárias para
a objetividade de juízos gerais, sintéticos a priori. Assim
é possível explicar a relação ambígua de Kant com a metafísica, bem como a
mudança de significado que esse termo sofre através da crítica Kantiana à razão[2].
Ainda, segundo Habermas, pode-se manter a
expressão “metafísica” para todo o tipo de elaboração de questões metafísicas
que visam à totalidade do mundo do homem, citando as concepções de Leibniz,
Spinosa ou Schelling e incluindo a doutrina Kantiana dos dois reinos, situadas
na tradição dos grandes esboços sistemáticos, que têm início em Platão e
Aristóteles[3].
E conclui este pensamento: Aos olhos de Heidegger, o próprio Nietzsche ainda
tem de ser visto como um metafísico, por ser um pensador moderno, sujeito ao
princípio da subjetividade[4].
Habermas afirma não ter dúvidas
quanto às tarefas reconstrutivas da Filosofia,
elencando duas espécies de metafísica: A da natureza (conhecimento que
determina objetos) e a metafísica dos costumes ou arquitetônica da razão
(Kant), com a separação das faculdades do conhecimento objetivador, da intuição
moral e do juízo estético, concluindo que: “Todas as competências da espécie, de sujeitos capazes de falar e de
agir, são acessíveis a uma reconstrução racional, na qual se detecta aquele
saber prático do qual lançamos mão intuitivamente quando produzimos qualquer
realização já comprovada”[5].
“Mas alguma coisa ocorreu. Quebrou-se o encanto. O céu,
morada de Deus e seus santos, ficou de repente vazio. Virgens não mais
apareceram em grutas. Milagres se tornaram cada vez mais raros, e passaram a
ocorrer sempre em lugares distantes com pessoas desconhecidas. A ciência e a
tecnologia avançaram triunfalmente, construindo um mundo em que Deus não era
necessário como hipótese de trabalho. Na verdade, uma das marcas do saber
científico é o seu rigoroso ateísmo metodológico [...]”[6].
Entende-se que os métodos científicos jamais decifrarão a
metafísica em função do racionalismo construtivista, mesmo detectando saberes
intuitivamente ou a priori, é indispensável a reconstrução, no dizer de
Kant a construção de um juízo analítico, de alguma realidade imanente que
valide o juízo sintético.
Da mesma forma, a razão não pode perscrutar elementos que
transcendam a natureza em todos os aspectos da razão humana. Trata-se de
objetos diferentes, de relações diversas que falam de mundos diversos: enquanto
a razão fica circunscrita ao mundo natural, ou mundo dos homens, a metafísica
reporta-se ao mundo de Deus.
Muito bem colocou Habermas quando, benevolentemente, escreveu
que, para o europeu, seria de menos complexidade o entendimento metafísico na
tradição judaico cristã, contudo, ao ampliar-se o espectro metafísico a outras
formas de tradição religiosa se tornaria impossível harmonizar a compreensão
racional diante da variedade e divergentes formas de conhecimentos a priori.
[...] O animal é o seu corpo. Sua programação biológica é
completa, fechada, perfeita. Não há problemas não respondidos. E, por isso
mesmo, ele não possui qualquer brecha para que alguma coisa nova seja
inventada. [...] A aventura da liberdade não lhes é oferecida, mas não recebem,
em contrapartida, a maldição da neurose e o terror da angústia.
Como são diferentes as coisas com o homem!
Se o corpo do animal me permite prever que coisas produzirá [...] e as coisas
por ele produzidas me permitem saber de que corpo partiram, não existe nada
semelhante que se possa dizer dos homens. [...] Porque o homem, diferentemente
do animal que é o seu corpo, tem o seu corpo. Não é o corpo que o faz. É
ele que faz o seu corpo[7].
Kant chamou de metafísica a ciência que estuda Deus,
liberdade e imortalidade. Existem outros nomes e outras conceituações, por
exemplo, a Teologia, cujo especialista se dedica a estudar os tais fenômenos,
porém com grandes limitações geradas pelos dogmas religiosos. Neste ponto,
indaga-se: terá a ciência a mesma sorte? Enquanto as religiões impedem a Teologia
de qualquer contribuição para uma compreensão harmoniosa das questões
metafísicas, a metodologia científica também não procura aprisionar o
conhecimento adquirido pela razão, emoldurando o corpo?
A Teologia viveu sob a influência do racionalismo,
especialmente o racionalismo alemão. Com investimentos do Estado, inaugurou-se
o período da hermenêutica crítica literária e da crítica da forma. Muito se
investiu em arqueologia e nas pesquisas linguísticas com o propósito de criação
de uma base de entendimento do texto canônico. Vale destacar que os objetivos
das pesquisas sempre foram focados na tradição judaico-cristã. Na informação de
Werner Georg Kümmel, em seu livro Einleitung in das neue testament (Quelle & Meyer, Heidelberg, 1973 no parágrafo terceiro de sua introdução, é
feito um pequeno histórico a respeito da crítica textual, citando a obra Histoire
Critique do NT, de Richard Simon (1689–1693) como o início do caminho para
uma introdução ao Novo Testamento como disciplina científica. Kümmel cita
inúmeros autores, dos quais desça-se: J. D. Michaelis, com sua obra Einleitung
in die göttlichen Schriften dês Neuen Bundes (1750); J.S. Semler: Abbandlung Von freier Untersuchung des Canon
(1771 – 1775); J. G. Eichhorn: Einleitung in das NT (1804 – 1827), em
cinco volumes constituem a primeira pesquisa realmente livre de opiniões
preconcebidas a respeito da origem dos escritos do cânon e do texto do NT. Seguiram-se-lhes, mantendo o mesmo nível de
seriedade crítica, as obras de Wette, Schleiermacher, Gredner, Reuss, Hug e
outros[8].
Semelhante esforço se deu na análise crítica textual do
Antigo Testamento, tendo iniciado também na época do Iluminismo e do
racionalismo. O objetivo de trilhar o caminho filosófico contemporâneo à época,
naturalmente foi de extrair da Bíblia a religião pura da razão. Na lavra de
Georg Fohrer, a intenção baseava-se em considerações de natureza dogmática
quanto no resultado da equação de doutrina eclesiástica com a teologia bíblica
da parte do supranaturalismo, contra o qual lutava o racionalismo filosófico.[9]
Registre-se, ainda, a confirmação da preconização de J. P. Gabler em 1787 em
conferência sobre: a diferença real
entre teologia bíblica e teologia dogmática e a correta determinação dessas
duas disciplinas[10].
Registra, ainda, Fohrer:
|
Pelos fins de 1880, formou-se a escola
histórica da religião [...] provocou
uma clara distinção entre a perspectiva da história e a do dogma submetendo a
religião israelita, o judaísmo e o cristianismo a uma abordagem estritamente
histórica, que fosse impulsionada não por razões teológicas, mas simplesmente
no seu próprio interesse, tendo como meta uma síntese histórica[11].
|
Julga-se necessário informar alguns dos resultados da
aplicação de metodologia puramente científica ao cânone da tradição judaico
cristã, para melhor compreensão do leitor laico. Destaca-se a reconstituição
dos textos mais próximos dos originais que a ciência conseguiu chegar,
constatação de pluralidade religiosa em ambos os livros sagrados, a autoria dos
livros sucumbiu à análise histórica com exceção das epístolas paulinas,
constou-se vários gêneros literários na grande maioria dos livros, indicando,
em especial no chamado Velho Testamento, que a tradição oral foi a fonte
principal dos manuscritos e a forma escrita feita por vários escritores de
diversas influências, constou-se o uso de figuras mitológicas, figuras de
linguagem e a influência de religiões próximas. Como consequência da aplicação
do método crítico histórico e literário, há uma profunda quebra relacional com
a teologia dogmática.
Outrossim, através de arrostados e permanentes estudos na
área teológica, verificou-se que, apesar do apedeutismo histórico e literário
constatado na juntada dos livros que compõem o cânon, indubitável restou não
existirem divergências principiológicas de natureza teológica em nenhum dos
livros. A Bíblia é uma harmoniosa coletânea de livros de natureza teológica,
com diversos estilos literários e autores desconhecidos.
É interessante notar que o período do Iluminismo assemelha-se
a um prelúdio que ambienta o racionalismo, onde uma eclosão de descobertas e
saberes afloram como se o pensamento humano, liberto das cadeias medievais e do
domínio governativo e da tutela dos dogmas da igreja papal, fosse provocado por
um sistema de ignição produzindo simultânea e encadeadamente uma ciclópica
quantidade e diversidade de conteúdos filosóficos. Ocorre como se fosse
retirada a opressora rolha da mais sofisticada champanhe, liberando seus
magníficos odores intensos e provocativos.
Não se pode excluir do estudo da metafísica, ainda que de
forma tão resumida, a obra e o pensamento de Karl Marx e Friedrich
Engels, Soren Aabye
Kierkegaard, Ludwig Feuerbach, Georg Wilhenlm Friedrich Hegel, Friedrich Wilhelm Nietzsche e muitos
outros filósofos de renome e importância literária. Alguns
dos citados autores hão de trazer suas contribuições para este trabalho
monográfico, contudo, pretende-se limitar a dissertação sobre a metafísica aos
limites de um capítulo, mesmo entendendo-se ser o tema central do racionalismo,
ou para negá-la, reafirmá-la ou harmonizá-la às novas concepções do pensamento
humano.
Antes de prosseguir-se no
desenvolvimento analítico torna-se necessário e oportuno estabelecer o conceito
autoral sobre o significado da linguagem por referência a metafísica, religião
e teologia. A metafísica é a linguagem filosófica, portanto laica, que define a
busca racional ou ideal de Deus, liberdade e vida eterna. A religião é o
resultado de um experimento sensório permissivo ao dogmatismo, que pode
produzir conjecturas filosóficas, teológicas, éticas e morais. Já a teologia se
ocupa em conhecer os valores imanentes de Deus na vida dos seres humanos e na
natureza. É uma análise profundamente voltada para a compreensão destes valores
e de sua origem, razão pela qual a Teologia se ocupa em analisar a totalidade
das potencialidades humanas, tanto em relação ao saber e a razão, quanto em
relação aos sentimentos e emoções. A Teologia perpassa pela cultura, grupamento
social, economia, filosofia, literatura, artes e todas as áreas do conhecimento
e da vida humana. A Teologia compreendeu seus limites aos fenômenos
transcendentes e não busca mais desvendar o que não nos foi dado a capacidade
de conhecer.
Rubem Alves, com sua tradicional verve literária, desenvolve
uma crítica a concepção de Marx sobre a religião e seu materialismo dialético,
a qual se procurou trazer a termo em sinopse.
[...] Mas o solo em (Marx) pisa desconhece
o mundo sacral. [...] Ele é secularizado do princípio ao fim e somente conhece
a ética do lucro e o entusiasmo do capital e da posse. [...] De fato, o
materialismo que é uma exigência do próprio sistema que só conhece o poder dos
fatores materiais. É a lógica do lucro e da riqueza que assim estabelece – e
não as inclinações pessoais daquele que a analisa. [...] (para Marx) A religião
não era culpada (pelas desgraças sociais de então) pela simples razão de que
ela não fazia diferença alguma. [...] Ela não era causa de coisa alguma. Um sintoma
apenas. [...] Os filósofos revolucionários, hegelianos de esquerda, não passavam
de réplicas de D. Quixote. [...] Marx riu disto. Os hegelianos vêem o mundo de
cabeça para baixo. [...] “Não é a consciência que determina a vida; é a vida
que determina a consciência”. E ele afirmava: “Até mesmo as concepções
nebulosas que existem nos cérebros dos homens são necessariamente sublimadas do
seu processo de vida, que é material, empiricamente observável e determinado
por premissas materiais. [...] Os homens são os produtores de suas concepções”.
“É o homem que faz a religião; a religião não faz o homem”. [...] Quem é esse
homem que produz a religião? Ele é um corpo, corpo que tem de comer, corpo que
necessita de roupa e habitação, corpo que se reproduz, corpo que tem que
transformar a natureza, trabalhar, para sobreviver. Mas o corpo não existe no
ar. [...] Vemos homens indissoluvelmente amarrados aos mundos onde se dá sua
luta pela sobrevivência, e exibindo em seus corpos as marcas da natureza e as
marcas das ferramentas. [...] E Marx se pergunta sobre um outro tipo de
trabalho que daria prazer e felicidade aos homens, trabalho companheiro das
criações dos artistas e do prazer não utilitário do brinquedo e do jogo...
Trabalho expressão da liberdade, atividade espiritual criadora, construção de
um mundo em harmonia com a intenção... É claro que Marx nunca viu esse sonho
utópico realizado em sociedade alguma. Foi ele que o construiu [...]. [...] Sua
marca está nisto: o homem deseja algo. Seu desejo provoca a imaginação
visualiza aquilo que é desejado [...]. A imaginação e o desejo informam ao corpo,
que se põe a trabalhar, por amor ao objeto que deve ser criado. E quando o
trabalho termina o criador contempla a sua obra, vê que é muito boa e
descansa...”[12].
Rubem Alves segue questionando os processos que envolvem o
trabalhador dentro das condições atuais: ele tem que alienar o seu desejo, pois
trabalha para outro e pelo desejo do outro, o objeto a ser produzido não é
resultado de sua decisão. Na verdade, o trabalhador, muitas vezes, participa de
uma pequena parte do fazer o objeto, aperta um parafuso, dá uma martelada. Por
tudo isso, o trabalho não é uma atividade prazerosa, mas uma atividade que dá
sofrimento e cria um mundo independente da vontade de operários... e
capitalistas, que são igualmente alienados pela lei do lucro. Este é o mundo
secular, utilitário, capitalista, regido pela lógica do dinheiro, contra o qual
os trabalhadores só possuem seus corpos que para produzirem necessitam estar
acoplados às máquinas. Igualmente acoplados estão os corpos que habitam o mundo
do lucro, não a máquinas, mas aos colarinhos brancos, aos restaurantes que
frequentam, às aventuras amorosas que têm, e às enfermidades cardiovasculares
que os afligem. Compreende-se que o que as pessoas têm normalmente nas suas
cabeças não seja conhecimento, não seja ciência, mas pura ideologia, fumaças,
secreções, reflexos de um mundo absurdo. Marx antevê o fim da religião. Ela só
existe numa situação marcada pela alienação. É equivocado pensar que o sagrado
é somente aquilo que ostenta os nomes religiosos tradicionais[13].
“Parece que a crítica marxista da religião
não termina com ela, mas simplesmente inaugura um outro capítulo. Porque, como
Albert Camus corretamente observa, “Marx foi o único que compreendeu que a
religião que não invoca a transcendência deveria ser chamada de política...”.”[14].
[1] Restam ao autor dúvidas
quanto à inclusão nesta dissertação de tema tão controverso na história do
conhecimento humano, em especial em função de já se haver concluído que a
Ciência do Direito Brasileiro segue uma linha iniciada em Augusto Kant e
fundada no neopositivismo. Contudo, a imperiosidade do momento gera razões que
propiciem passar-se ao largo do assunto, ainda que, a abordagem seja um modesto
ensaio superficial, orientador.
[2] HABERMAS, Jürgen.
Pensamento pós-metafísico: estudos filosóficos, traduzido do original alemão
por: Nachmetaphysisches Denken, Philosophische Aufsätze. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1990. P. 22
[8] KÜMMWL,
Werner Georg. Introdução
ao Novo Testamento; tradução de 17ª ed. Inteiramente refundida e aumentada da
Introdução ao Novo Testamento por Paulo Feine e Johannes Behm por Isabel Fontes
Leal Ferreira e João Paixão Neto. São Paulo: Paulus, 1982. P. 24-25
[9] FOHRER, Georg. História
da Religião de Israel; tradução de Josué Xavier; revisão de João Bosco de Lavor
Medeiros. São Paulo: Edições Paulinas, 1982. Pg. 9-10
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