Prezados amigos,
Gostaria de desenvolver um pensamento lógico-filosófico, pedindo desculpas antecipadas aos mais pragmáticos.
“Vírus são parasitas intracelulares obrigatórios: a falta de hialoplasma e ribossomos impede que eles tenham metabolismo próprio. Assim, para executar o seu ciclo de vida, o vírus precisa de um ambiente que tenha esses componentes. Esse ambiente precisa ser o interior de uma célula que, contendo ribossomos e outras substâncias, efetuará a síntese das proteínas dos vírus e, simultaneamente, permitirá que ocorra a multiplicação do material genético viral”.
“Em muitos casos os vírus modificam o metabolismo da célula que parasitam, podendo provocar a sua degeneração e morte. Para isso, é preciso que o vírus inicialmente entre na célula: muitas vezes ele adere à parede da célula e "injeta" o seu material genético ou então entra na célula por englobamento - por um processo que lembra a fagocitose, a célula "engole" o vírus e o introduz no seu interior”.
Como lemos o singelo texto nos fala de um ser de tamanha simplicidade, considerado um para um parasita intracelular por não conseguir desenvolver suas funções vitais sem os elementos de uma célula, contudo, muitos vírus provocam a degeneração e a morte da célula hospedeira, consequentemente a sua própria morte.
Quero reproduzir a primeira proclamação do Tratado de Estocolmo, de 5 a 16 de junho de 1972:
1 - O homem é ao mesmo tempo criatura e criador do meio ambiente, que lhe dá sustento físico e lhe oferece a oportunidade de desenvolver-se intelectual, moral, social e espiritualmente. A longa e difícil evolução da raça humana no planeta levou-a a um estágio em que, com o rápido progresso da Ciência e da Tecnologia, conquistou o poder de transformar de inúmeras maneiras e em escala sem precedentes o meio ambiente. Natural ou criado pelo homem, é o meio ambiente essencial para o bem-estar e para gozo dos direitos humanos fundamentais, até mesmo o direito à própria vida.
Para facilitar o raciocínio, desconsiderarei a questão dos direitos humanos fundamentais, pois existem questionamentos atuais de natureza econômica, jurídica e filosófica sobre alguns dos direitos elencados pela ONU.
Igualmente, vamos retirar do texto as seguintes partes: lhe dá sustento físico; lhe oferece a oportunidade de desenvolver-se intelectual, moral, social e espiritualmente. São expressões politicamente corretas de grande subjetividade e que exigem critérios hermenêuticos para uma interpretação segura, porém nunca consensual.
Retirando os adjetivos e demais complementos vamos trabalhar com o fulcro do texto, que interpreto da seguinte forma: “O homem é ao mesmo tempo criatura e criador do meio ambiente. A evolução da raça humana com o rápido progresso da Ciência e da Tecnologia conquistou o poder de transformar o meio ambiente de inúmeras maneiras”.
De plano percebo, apesar da citação do ser humano como criatura, o foco do texto esta na condição de criador e nas transformações percebidas. Na Declaração do Rio acontece a mesma coisa, apesar de citar a Terra como nosso lar, o texto, com outra abordagem, orienta o foco para a centralidade do ser humano no processo de desenvolvimento sustentável: “Os seres humanos estão no centro das preocupações com o desenvolvimento sustentável”.
Quando falei que a questão do meio ambiente e desenvolvimento sustentável é uma questão existencial, quis resgatar o conceito de criatura. Os prolegômenos das discussões e dos tratados estão equivocados, é necessária a compreensão racional do significado de ser criatura, sem o que, restará somente a questão do desenvolvimento sustentável sem a devida compreensão racional dos reais motivos de sua necessidade, de sua urgência, de seus limites.
Fazendo a ligação com os primeiros parágrafos, seria tentar educar o mundo viral para que sua reprodução deva ser contida, que eles devem cuidar bem das células hospedeiras para que elas tenham vida longa. Como vírus não tem cérebro, de nada adiantaria. Da mesma forma como a discussão não está voltada para a continuidade da espécie humana e, sim, sua atividade produtiva, a qual também lhe é natural, o comportamento das sociedades humanas são semelhantes ao comportamento das sociedades virais.
Esse fenômeno acontece em razão dos paradigmas do senso comum na discussão dos valores sociais: o emprego é fundamental; sem o extrativismo não se sustenta família; o agronegócio é o carro chefe da economia do país; sem energia elétrica as pessoas não sobreviverão; os países em que as populações estão abaixo da linha da miséria é resultado da corrupção interna.
Com um profundo lamento, pois professo a fé reformada com muita dedicação, mas não posso deixar de citar que o paradigma dos valores religiosos é dos mais nefastos na disseminação do senso comum que não prioriza a condição do homem como criatura natural inteiramente dependente do mundo em que vive. Os dogmas determinam uma origem divina, o controle divino do universo e a passagem para outro mundo. O ser humano é o centro do universo, pois tem um deus que se preocupa com ele.
Enquanto a discussão se desenvolve em torno dos valores sociais, o fulcro da questão fica esquecido: os seres humanos morrerão de forma semelhante aos vírus, pela autodestruição de seu hábitat, contrariando todo o correto entendimento da fé cristã, ao meu entendimento.
Para uma questão existencial não há paradigma de valore que possa prevalecer, razão pela qual deve-se mudar o foco das discussões e das ações: o discurso não pode ser salvem as baleias, as aves, as florestas – e sim, Salvem os Seres Humanos! É necessário possuir uma infinita determinação e uma obstinada paixão para salvar os seres humanos do suicídio coletivo, tal como no pensar de Nietzsche: “É preciso ser inflexível até a dureza às coisas espirituais para suportar minha seriedade, minha paixão. Deve-se estar acostumado à vida nas montanhas para enxergar abaixo de si a medíocre falação da política e do egoísmo das nações. É preciso ter-se tornado indiferente, nunca perguntar se a verdade é útil ou fatalista....”
Para terminar quero deixar uma citação de Dietrich Bonhoeffer, pastor da Igreja Luterana na Alemanha, atacou as impiedades de Hitler e conspirou contra o regime nazista, foi preso em abril de 1943, enquadrado na lei de segurança do Terceiro Reich e confinado em vários campos de concentração da Gestapo, e finalmente executado em abril de 1945.
“Otimismo, entretanto, não é essencialmente uma opinião sobre a presente situação, mas representa uma força vital, uma energia da esperança, onde outros resignam, uma resistência de manter erguida a cabeça, quando tudo parece querer fracassar, uma força que jamais entrega o futuro ao adversário, mas o reclama para si. Sem dúvida alguma existe um otimismo covarde, estúpido, tolo que não pode colher aprovação de ninguém. O otimismo entretanto, que equivale a uma vontade para o futuro, ninguém deverá menosprezar, mesmo que erre centenas de vezes. Eis que é a saúde da vida, que o doente não deve contaminar. Homens há que julgam ser condenável, cristãos inclusive existem que consideram ser ímpio esperarmos um futuro terreno melhor e prepararmo-nos para tanto. Acreditam eles no caos, na desordem, na catástrofe como sentido dos acontecimentos presentes e assim se recolhem para a resignação e pia fuga ao mundo, escapando destarte à responsabilidade para a continuação da vida, a reconstrução e as gerações a vir. Pode ser que o Dia do Juízo seja amanhã, pois bem, então será de bom grado que desistamos do trabalho em favor de um futuro melhor, mas antes não”. Bonhoeffer, Dietrich. Resistência e Submissão, tradução de Ernesto J. Bernhoeft – 2ª edição – Rio de Janeiro: Paz e Terra; Rio Grande do Sul: Sinodal, 1980. P. 29-30.
Vamos continuar discorrendo sobre o assunto, o texto ficou muito grande, no que já peço desculpas, mas não pode ser conclusivo, é apenas mais uma forma de abordar a questão do debate.
Abraços,
Wagner Winter